quarta-feira, 27 de abril de 2011

Um monte de nada

Ligou o carro sob aquele sol infernal e deu a partida no velho Fusca 78. "Atravessar desertos é uma merda. Um monte de nada" pensou. Colocou uma fita-cassete e com o volume ao máximo ouviu Born To Be Wild. Jack o quebrou ao montar aquela motocicleta e sair por aí com o vento batendo-lhe no rosto. Stepen Wolf o fez pensar que poderia ser um franco atirador.
Kerouac embriagado, atravessando a América, dormindo com mariposas e anotando seus sonhos enquanto em algum quarto pequeno, triste e decadente, um velho escreve contos sujos para a Xota. Garrafas de cerveja vazias se amontoam num canto e tudo se embriaga de solidão, tédio e desespero.

O Fusca dá o máximo de si. O pedal do acelerador beija o assoalho empoeirado do carro. Porto Alegre agora é uma miragem que desapareceu no horizonte como um fantasma capenga.

Quando criança, antes mesmo de assistir Jack e seu parceiro com suas motocicletas em estradas sem fim, antes de ouvir Born To Be Wild, Carlos ouvia estórias sobre os desertos gaúchos. Depois de ouvir tudo aquilo, sobre os homens que morriam de sede, que se perdiam e eram picados por serpentes sob um sol escaldante, Carlos ia para a janela de sua casa com mil imagens e pensamentos em sua cabeça. Lá fora vaga-lumes, grilos, besouros e outros insetos pareciam enlouquecidos na escuridão. Carlos observa os insetos, as folhagens, a grama verde, os campos e as árvores que cercam tudo. Tudo inacreditavelmente verde, úmido do orvalho da noite e gotejando vida por todos os lados. Carlos não podia acreditar nos desertos gaúchos, mas nunca conseguiu esquecê-los.

O motor do Fusca roncando grotescamente sob o chão árido do deserto. O sol queimando a lataria do carro, a retina dos olhos de Carlos, os pedregulhos, a rala vegetação. Pequenas pedras saltavam para os lados como se tivesse vida, enquanto Carlos zunia com seu automóvel. Horas se passaram e Carlos continuava sem parar. "Um monte de nada", voltou a pensar olhando para a paisagem crua.

Sem saber o motivo Carlos sentiu vontade de dar um cavalo de pau no meio daquele deserto. "Ninguém atravessa um deserto sem dar um cavalo de pau", pensou Carlos com a garganta seca. Carlos acelerou o que pode, o velho Fusca rosnou como um valente monstro cansado, o toca-ficas esgarçando Born To Be Wild e tudo sacolejando e poeira e pedregulhos voando e ele com a mão grudada no freio de mão. Então o caralho do Fusca valente girou, girou, girou e tudo rodava rápido demais aos olhos de Carlos e uma nuvem de poeira engoliu tudo. Com um forte solavanco tudo parou de girar, menos a cabeça de Carlos e a poeira invadiu seus olhos e garganta e ouvidos e então ele deu uma grande gargalhada e olhou para a noite que despencava no horizonte daquele fodido deserto gaúcho.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Entre aspas

Ando um pouco afastado do cavalos meu velho companheiro. Não lembro a última vez que escrevi um conto, pretendo um dia voltar a escrever. Micros histórias, contos... Estou dando atenção para meu blogue de desenhos, resolvi usar 2011 para desenhar mais. Nunca consegui conciliar muito desenhar e escrever. Minha cabeça muda de foco, a forma de pensar é diferente, as idéias são diferentes, o estado de espírito é diferente. Não pretendo abandonar o Cavalos, mesmo demorando mais, postarei algo aqui.

...

Carlos sentava toda tarde em frente sua casa. Alguns amigos apareciam para bater um papo, jogar conversa fora e fumar cigarros. O bairro todo, no verão, tinha uma iluminação diferente. Os dias passavam lentos, muitos estavam sem empregos fixos ou otalmente sem empregos. O melhor da tarde era ver Suzana passar desfilando seus cabelos crespos. Não saia com ninguém do bairro e nunca parava para conversar.

domingo, 10 de abril de 2011

Adeus, Bogotá!

Algumas vezes por semana Joana passou a me alimentar. Aparecia em casa, cozinhava, sorria. Comíamos com prazer, como deve ser.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

...

Virei-me em direção a voz.




- Como estão as coisas? Ainda escrevendo? - perguntou.



- Não - respondi.